sábado, 27 de abril de 2024

QUEIXAS DE UM ANCIÃO

  HOMENAGEM 


*Josefina Cardoso Braz - na Bienal do Livro de Itabaiana 2013.
 Nasceu em 28 de abril de 1926 e faleceu em 6 de novembro de 2021 em Natal/RN


Senhor, há dois mil anos comemoramos o teu nascimento, e na simplicidade da manjedoura que te serviu de berço, no desamparo de Maria pressionada pelas dores do parto, na aflição de José sem arrimo, sem hospitalidade, nós te bendizemos.

Estava escrito e na magia da noite pura, num recanto do Oriente nasceste Rei, Senhor, o Prometido, pobre, abandonado, em anonimato, iluminado apenas pela “estrela guia”, sinal da tua realeza, e marcado pela procura dos Magos que profetizaram a grande chegada. Cumpriste a missão de Salvador, Redentor e morreste pela humanidade.

Porém, Senhor, eu humildemente me proponho lembrar-te; não envelheceste, não sofrestes as agruras, a tristeza, a discriminação, as dores e a solidão no passo-a-passo da caminhada que leva à ancianidade. Mas eu, Senhor, eu envelheci e senti as transformações do meu corpo que dantes moço e esbelto é hoje refletido nos espelhos da vida deformado, aniquilado.

A imagem da face que outrora expressiva e sorridente punha em escanteio as desventuras, é agora máscara macerada pelo tempo, contestando a verdade, existente apenas, em antigos retratos.

Minhas mãos trêmulas corroídas pela artrose, são trapos denunciadores da incapacidade, da inutilidade.

Meu grito se esvai pelo universo, sem retorno, e sou só, absolutamente só, embora, na multidão.

Ouço-Te neste momento como a dizer: - “Que queres tu? Abolir da vida, o envelhecer? Abreviar o “grande sono” e dizimar, no florescer da idade o gênero humano? As rugas, deformações, enfermidades, são tributos que pagas por viver muito. Nada te valeu a pena? Que dizes da experiência que adquiriste através do dia-a-dia, contribuições que legas à atual e futuras gerações, pelo exemplo do teu trabalho, pela tenacidade das tuas decisões e pela força do teu idealismo? Não levas em conta, a alegria de contemplar, embora na imobilidade da tua cadeira, o rosto sorridente do netinho e vislumbrar os fios prateados enfeitando a expressão no rosto do teu filho? Criatura, faz um retrospecto da tua trajetória nesse mundo; afasta as dores, as lágrimas, os espinhos e lembra que o teu caminho foi também pontilhado de flores e rastros luminosos de felicidade. Chegar à velhice é desfrutar da oportunidade de semear e colher!”

Baixo então a minha cabeça tristemente e murmuro:

- Perdoa-me, então, Senhor! Pelo mistério da tua passagem por esse mundo, pela inacessível consubstanciação do Deus Uno em Trino, pela fé que se perpetuou nos corações até dos mais empedernidos, eu te imploro, Divino Infante, perdoa-me! Perdoa-me por essas divagações que te podem magoar. Sendo eu, partícula da humanidade, que quiseste redimir, sou passível de erro, ingratidão; incompreensão.

Mas te confesso, Senhor, hoje, quando em mim o crepúsculo é mais longo e mais intenso que a aurora, no limite da vida e na decadência desse existir, é penoso aceitar. É triste, e repito como já disse alguém: É TRISTE A GENTE VELAR O SEU PRÓPRIO CADÁVER E MORRER ANTES DA MORTE CHEGAR.

JOSEFINA-CARDOSO-BRAZ - 19.10.95 (QUINTA-FEIRA) 

{para a interpretação de Gasu durante solenidade na Escola Técnica Federal de Sergipe}

       

Professora Lilian Corrêa Machado, ex-colega
 e amiga da professora Josefina Braz

Expressão sobre o legado da profa. Josefina Braz, membro desta Academia Literária de Vida, escrita um dia após a morte dela, por sua colega na época, a professora Lilian Corrêa Machado e hoje resgatada pela confreira Sandra Natividade:

 Para a amiga Josefina Braz

     Aqueles que fizeram a antiga ETFS encontram-se de luto. Faleceu a nossa querida amiga Profa. Josefina Cardoso Braz, Dona Zifa como era chamada carinhosamente. Mulher de fé, sabedoria combativa, corajosa, consoladora, conselheira, o ombro amigo sempre à disposição daqueles que precisavam do amparo de uma palavra na medida certa e no momento exato de sua necessidade. Diz o ditado “conselho e água se dá a quem pede” e ela era sempre a fonte onde muitos iam beber.

    Por 26 anos guardei e guardo até hoje uma crônica escrita por ela para ser lida pela irmã Gazu sublinhada em algumas palavras que ela dava ênfase maior.

    Agora que não mais está aqui, guardo com carinho e envio a todos que tiveram o privilégio de conhecê-la e quiserem copiar e guardar como lembrança.

    Que Deus a receba com o carinho que ela sempre dispensou a todos durante a caminhada nesta vida.

    Pêsames para toda a família e para todos nós que convivemos com ela.

Aracaju,07.11.2021

Lilian Corrêa Machado - Profa. de Geografia da ETFS 1961-1989.




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