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2-Cesartina Regis de Amorim

(08/11/1890-15/02/1980). Natural da cidade de Laranjei­ras, nasceu no dia 8 de novembro de 1890, filha de João Regis e Amélia Regis. Na sua cidade começou os estudos aos cinco anos de idade. Mudando-se para Aracaju com a família, completou o curso primário com a professora Maria da Glória Chaves. Fez o Curso Secundário na Escola Normal, celeiro de intelectualidades femininas de Sergipe. Foi excelente aluna, terminando o curso com brilhantismo.
Influenciada pela colega e amiga Consuelo Menezes, filha do Presidente do Estado de Sergipe, Dr. Josino Menezes, resolveu fazer o exame de madureza (o vestibular da época) para cursar a Faculdade de Farmácia, sendo a única pessoa aprovada. Os outros concorrentes foram eliminados, logo na prova de Português. Por este motivo Cezartina teve de fazer todas as outras provas no mesmo dia, entrando pela noite. Uma verdadeira maratona, levando-se em conta que naquela época as provas eram dissertativas. Quase uma monografia. Seguiu Cezartina para o Rio de Janeiro, onde foi hospedada por familiares.
Uma coincidência na vida da acadêmica Cezartina Regis: quando de viagem para o Rio de Janeiro, seu pai entregou-lhe uma carta que ela deveria entregar ao amigo Maximino Maciel (o gramático e membro da Academia de Letras de Sergipe e do Brasil), caso necessitasse de alguma coisa. Cezartina nunca entre­gou a carta. Um dia, indo de bonde para a Faculdade, encontrou-se com um homem que a fitava intensamente. Ela já perdia a paciência, quando o cavalheiro lhe perguntou:
– Menina, você é de Sergipe?
– Sou, e com muita honra.
– De quem você é filha?
– Do capitão João Regis. E o senhor, quem é?
– Eu sou Maximino Maciel, amigo de seu pai. Você aqui no Rio e não me procurou?
– Pois é, meu pai me deu uma carta de apresentação; mas me recomendou que eu só o procurasse em caso de necessi­dade. Como não houve necessidade, não o procurei.
O Curso de Farmácia, naquela época, era realizado num período de dois anos. Mas poder-se-ia fazer em um ano e meio, adiantando as disciplinas. Foi o que fez Cezartina, a fim de poupar sacrifícios ao pai que tinha mais quatro filhos menores para educar.
Terminou o curso em 1911 e voltou para Sergipe, a fim de exercer a profissão. Em Aracaju, no Palácio do Governo, o seu diploma foi assinado pelo Presidente Rodrigues Dória, com a caneta de ouro a ela oferecida pelos colegas do Clube de Esperanto.

Cezartina Regis – A Farmacêutica. Começou a exercer a profissão de farmacêutica em Estância, na Farmácia “São José”. Lá trabalhou durante dois anos, ensinando a manipulação de remédios. Voltando para Aracaju, deu nome a várias farmácias. Em 29 de maio de 1931 foi nomeada para o cargo de Farmacêutico Inspetor do Centro de Saúde de Aracaju, com responsabilidade em todo o Estado de Sergipe. Fiscalizava todas as farmácias do interior, sem medir esforços, no cumprimento do dever.
De julho de 1931 a agosto de 1932 substituiu o
Inspetor da Área de Alimentos, sem nenhuma remuneração.
Em 1926 foi nomeada Farmacêutica da Penitenciária do Estado, com a incumbência de organizar e dirigir a farmácia recém-criada naquele presídio.
Entre 14 de outubro e dezembro de 1940 esteve à disposição do Interventor Federal. De 16 de setembro de 19 a março de 1943 presidiu a uma comissão de inquérito por indicação da Secretaria Geral do Governo.
Como Inspetor de Farmácia vejamos a atuação dessa grande mulher, através de suas próprias palavras, no discurso pronunciado quando da entrega das carteiras aos primeiros oficiais de Farmácia:
“Instruir, até convencer; orientar, até conseguir foi tarefa árdua e, por vezes, desanimadora, não fosse a vontade que, a serviço do cumprimento do dever, jamais enfraqueceu!... Desloquei-me da Capital, vencendo distâncias por todos os meios ao alcance: automóvel, trem, ônibus, caminhão, canoa, mal acomodada em espeluncas do interior, onde quer que vendesse um produto farmacêutico, incógnita, comprando ou mandando adquirir, com a nomenclatura viciada ou deturpada em uso local, os medicamentos, como se fora apenas uma interessada do alívio para o sofrimento, vendo para observar; aprendendo para ensinar... e, deste modo, pude informar-me da situação aflitiva desse povo, ora morrendo à míngua de um remédio que lhe debelasse o mal; ora comprando produtos impróprios ou corrompidos pela incapacidade, pela usura de vendedores ignorantes e inescrupulosos.”

Como Farmacêutico Inspetor, a doutora Cezartina Regis ia todos os meses visitar as farmácias e, medindo ou pesando as substâncias, calculava as possíveis perdas por evaporação, conforme a substância, comparava, à vista da receita médica, a entrada e a saída dos produtos.
Numa dessas visitas, D. Cezartina descobriu o desvio de trinta e sete ampolas de Sedol. O proprietário e o farmacêutico responsável não deram nenhuma justificativa. A Inspetora cumpriu o seu dever: empregou a devida multa. Inconformados, o farmacêutico, em nome da Firma, apelou para o Tribunal de Justiça. Influentes, politicamente, ganharam a questão. A Inspetora Cezartina apelou para o Supremo Tribunal Federal que lhe deu ganho de causa, por unanimidade e ainda lhe louvou o zelo profissional.
D. Cezartina fazia as farmácias respeitarem o plantão. Tarde da noite ela ia inspecionar a farmácia de plantão, verificar se a lâmpada vermelha estava acesa. Se na farmácia de plantão faltasse um medicamento procurado, qualquer outra deveria preencher a falta, sob pena de pesada multa, se não cumprisse a lei.

A Mulher em Destaque – Reportagem realizada por Cássia Maria Freire Barros, da Associação Sergipana Imprensa, com a Dra. Cezartina Regis de Amorim, para a Revista Alvorada:
Repórter: Dra. Cezartina, descreva para nossa Revista o seu curriculum vitae.
Disse que tem o curso Pedagógico pela Escola Normal e é formada pela Faculdade de Farmácia e Medicina do Rio de Janeiro, recebendo diploma a 21 de janeiro de 1911, assinado no Palácio do Governo, quando era Presidente o Dr. Rodrigues Dória, oportunidade em que seus colegas do Clube Esperanto lhe ofereceram uma caneta de ouro. Disse também que iniciou suas lides na cidade de Estância, na Farmácia “São José”, de propriedade dos Drs. Jessé Fontes de Andrade e Josafá Brandão. Posteriormente disse que deu nome às farmácias Indus­trial, Universal, Santo Antônio, Ipiranga e à Farmácia Souza. Na vida do Magistério, acrescentou que ensinou Português, Francês, Física, Química e História Natural, além de ter lecionado na Escola de Aprendizes Artífices de Sergipe, ao lado do Dr. Augusto Leite, bem como ensinou no Instituto “Coelho e Cam­pos”. Além disso tudo, acrescentou que foi Inspetora de Farmácias, sendo a primeira pessoa a assumir esse cargo, já que era recém-criado. Disse também que foi fundadora do Conselho Regional de Farmácia de Sergipe, sendo sua primeira Presidente, e fundou também a Associação Farmacêutica de Sergipe, da qual foi Presidente. Falou também que é sócia de todas as Associações Farmacêuticas do País. Disse também que participou ao lado das Dras. Bertha Lutz e Maria Rita Soares de Andrade, do movimento político-social pela libertação da mulher (feminismo), além de haver levantado com a Dra. Maria Rita a candidatura da professora Quintina Diniz, que foi a primeira constituinte de Sergipe.
Repórter: Dra. Cezartina, quais as homenagens que a senhora recebeu dos poderes públicos e entidades particu­lares, em reconhecimento pelo seu trabalho dignificante?
Respondeu que por ato do Prefeito Cleovansóstenes Pereira de Aguiar foi agraciada com a Medalha do Mérito Cultural “Inácio Barbosa”, e que no dia 17 de março passado, ela, juntamente aos Drs. Augusto César Leite, João Marques Guimarães, escritor Zózimo Lima e Epifânio Dórea, Secretário Perpétuo do Instituto Histórico e Geográfico de Sergipe, foram homenageados também pela Galeria de Arte “Rosa Faria” através da gravação na louça, de seus nomes e de suas realizações como pioneiros. Disse também que essa festa foi uma das mais lindas que já assistiu e que muito a sensibilizou.

Cezartina Regis – A Chefe de Família – Um ano após a sua formatura, Cezartina Regis perdeu repentinamente o seu pai. Antes de morrer ele lhe fez um apelo: “Minha filha, cuide da educação dos seus irmãos menores para que eles não venham a se envergonhar diante de você”. Ela prometeu e cumpriu. Educou os quatro irmãos menores: Nolita e Leyda, que se formaram professoras pela Escola Normal, Antônio, que se ordenou monge beneditino em São Paulo e se formou na Bélgica em Teologia, Filosofia e Direito Canônico, e Aloísio João, que morreu muito jovem. Para Leyda, que tinha apenas nove anos de idade quando o pai faleceu, D. Cezartina foi uma segunda mãe, orientando-a, acompanhando-a nos estudos e na formação espiritual.

Cezartina Regis – A Professora – Para manter a família, D. Cezartina teve de desbravar outros caminhos. Tornou-se também professora, com o direito que lhe conferia o diploma de normalista. Ensinou Português, Francês, Química e Física e mais História Natural em várias escolas de Aracaju: Escola de Aprendizes Artífices de Aracaju, hoje Escola Técnica Federal de Sergipe, de 1917 a 1920, e em 1927 foi nomeada professora do Instituto Profissional “Coelho e Campos”, sendo incumbida de ensinar também Desenho.

Cezartina Regis – A feminista – Quando surgiu o Movimento Feminino no Brasil, fundado pela Dra. Bertha Lutz, D. Cezartina, convidada pela Dra. Maria Rita Soares de Andrade e pela própria Bertha Lutz, aderiu à Federação Brasileira Para o Progresso Feminino, sendo a primeira secretária da seção sergipana da citada Federação, trabalhando ativamente pelo seu desenvolvimento.
Sobre o assunto, manteve assídua correspondência com as Dras. Maria Rita Soares e Bertha Lutz.
Lançou o nome da professora Quintina Diniz de Oliveira Ribeiro à Câmara Estadual pela Federação Brasileira Para o Progresso Feminino e pela União Universitária Feminina.
“Em Sergipe as mulheres se distinguiram no trabalho. Destaco Cezartina Regis, formada em Farmácia, figura muito atuante na sociedade. Procurei-a para participar da Federa­ção Brasileira Para o Progresso Feminino. Ela aceitou. Juntas fundamos o núcleo de Sergipe. Ela era quem movimentava a Federação, em Sergipe.”
(Testemunho da Dra. Maria Rita Soares, a quem entrevistei, em sua residência em Santa Tereza, no Rio de Janeiro.)
Participou das regionais da Federação, realizadas em Salvador, sendo oradora, representando a seção de Sergipe.

Cezartina Regis – A Mulher Cristã e Benemérita – Apesar de todo o seu trabalho como profissional, D. Cezartina ainda encontrava tempo para as crianças pobres. Todos os domingos ia com a irmãzinha Leyda ao bairro Santo Antônio. Reunia as crianças no gramado, em frente ao Hospital Santa Isabel e lhes ensinava o catecismo. Aliado aos bombons que distribuía implantava nos coraçõezinhos daquelas crianças humildes a grandeza da Boa Nova. E não só às crianças, também aos detentos ela levava a palavra de Cristo.
Dois fatos interessantes na vida de Cezartina, envolvendo marginais:
Certa vez, a nossa residência foi visitada por um ladrão que levou as poucas joias pertencentes a “Cesinha”. Vários dias a polícia andou a cata do ladrão, mas não o encontrava. Um dia, nosso irmão Milton e um companheiro encontraram um homem suspeito, como que rondando uma casa. Prenderam-no. Era o ladrão das joias de “Cesinha”. Na polícia ele contou onde estavam escondidos os valores que nos foram restituídos. Pois bem: “Cesinha” foi conhecer o homem e agradecer-lhe por não haver matado, nem ferido com o seu punhal a nossa mãe velhinha que sossegadamente dormia. Perguntou-lhe também se sabia de quem ela era filha. Ele respondeu que sim: “seu pai era o capitão João Regis”. Ela lhe disse: então você sabe que eu sou uma moça pobre. Essas joias são lembranças de meu pai: meu anel de formatura e esse cordão de ouro que ele se sacrificou para me dar. Continuando a conversa ela lhe perguntou se tinha filhos. Ele disse que tinha uma menina. Então ela lhe perguntou se era herança de um nome manchado que ele queria deixar para a filhinha. Deu-lhe uma lição de moral e pediu ao delegado que soltasse. Tempos depois, quando foi nomeada Farmacêutica da Penitenciária, lá encontrou José de Matos. “Mas rapaz, você está aqui?”. Ele respondeu: “É, a senhora me perdoou mas o dono da loja que eu assaltei, não”. Um companheiro de prisão lhe disse certa vez: “Se eu fosse você teria medo dessa doutora. Lidando com tantas drogas ela pode lhe envenenar”. E José de Matos respondeu: “Não corro esse risco. Se eu tivesse conhecido esta mulher antes de entrar neste caminho, hoje eu não estaria aqui”.
Outro ladrão a quem “Cesinha” converteu foi o facínora Manuel de Lili. Ela o encontrou na cadeia pública (onde hoje é o Palácio Serigy). Ele estava doente: havia sido mordido por uma louca (a cadeia servia também de hospício) o braço estava infeccionado. “Cesinha” pediu ao Dr. Eronides Ferreira de Carvalho, o grande cirurgião sergipano, que fosse clinicar o doente. Ele atendeu. E teve de amputar o braço de Manuel de Lili. Mas ele não resistiu e morreu pouco depois. Ele chamava “Cesinha” de minha-mãe. Todos os domingos, o padre ia, a pedido de “Cesinha”, celebrar a missa no presídio. E ela ia também assistir ao Santo Sacrifício com os presidiários e funcionários da Casa de Detenção. (Testemunho da professora Leyda Regis, irmã de Cezartina)

Cezartina – A Esposa - Cumprindo a palavra empenhada ao pai de educar os irmãos menores, “Cesinha” colocou a promessa acima de todos os seus sentimentos. Ela e o senhor João Henedino de Amorim conheceram-se e se enamoraram; mas tiveram de esperar vinte anos, até que ela formasse os irmãos. Foi um romance que teve como lenitivo para a longa distância as cartas que permutaram durante todos esses anos. Finalmente casaram-se em 1935, na capela do Lar Imaculada Conceição. Aí, também, comemorou as suas Bodas de Prata. Foi esposa dedicada. Seu trabalho nunca prejudicou a vida conjugal, porque o amor a tudo superava. Nunca colocou o marido à frente dos seus problemas profissionais. Não queria que ele fosse considerado “seu testa de ferro”. Viveram unidos, felizes e somente a morte os separou. Ele se foi, deixando no seu coração a saudade e a veneração da sua memória.” (Testemunho da profes­sora Leyda Regis).

Cezartina Regis – Vista por outros prismas – Cezartina Regis era eclética e foi a primeira em vários acontecimen­tos importantes da vida de Sergipe:
·                    Sócia fundadora do Clube de Esperanto, fundado pelo Dr. Alcebíades Correia Paz, sendo a primeira secretária do órgão. E falava muito bem o idioma universal.
·                    Sócia fundadora da Liga Contra o Analfabe­tismo, ao lado do almirante Aminthas Jorge.
·                    Sócia benemérita do “Lar Imaculada Concei­ção”, em São Cristóvão, que ela afirmava ser “a menina dos seus olhos”.
·                    Sócia contribuinte da Legião Feminina de Educação e Combate ao Câncer, e do Hospital São José.
·                    Sócia do Instituto Histórico e Geográfico de Sergipe.
·                    Fundadora do primeiro Clube Esportivo Feminino, juntamente com o almirante Aminthas Jorge e o capitão dos portos Oscar Alberto Lima e respectivas famílias, além de moças da sociedade, promovendo reuniões festivas e jogos de voleibol e basquetebol. Ela era componente do time Cotinguiba. O Clube Esportivo Feminino era composto da seguinte Diretoria: Presidente de Honra: Maria Eulália Lins de Azevedo; Presidente: Consuelo Menezes Paes; Vice-Presidente: Leonor Wynne Queiroz; 1ª Tesoureira: Laura Silva; 2ª Tesoureira: Luiza Paes Guedes; 1ª Secretária: Marina Jorge; Oradora: Cezartina Regis; 2ª Secretária: Corália Calasans; e Secretária Geral: Cândida Jorge.
Participante da Obra dos Tabernáculos, reserva­va algumas horas das quintas-feiras para costurar paramentos para a Igreja de São Salvador.

“Foi a primeira pessoa a dar combate, em Sergipe, oficialmente, à maconha. Quando Inspetora de Farmácias, tomou conhecimento de uma denúncia que na Barra dos Coqueiros havia um terreno com plantio da “erva maldita”. Imediatamente providenciou o aluguel de uma canoa, condução única existente na época e, acompanhada do seu secretário Juvenal Correia, muito cedo atravessou o Rio Sergipe, chegando ao romper do sol ao lugar destinado. Verificada a realidade da denúncia mandou exterminar a plantação, assistindo, sentada numa cadeira, a certa distância, de onde podia acompanhar com os olhos a operação de extermí­nio, permanecendo todo o dia, sob a inclemência do calor reinan­te, só voltando à noite, quando toda a plantação foi queimada e enterrada. Cansada, faminta, pois a merenda que levara dividiu com os companheiros de trabalho, depois de gratificar de seu próprio bolso o militar que a acompanhou. Chegando à casa encontrou os familiares aflitos por sua demora, satisfeitos, porém, pelo feliz desempenho do encargo a que se obrigara.”(Testemunho da professora Leyda Regis).

Foi a única mulher a ser homenageada, no primeiro grupo que recebeu o Diploma e a Medalha do Mérito Cultural Inácio Barbosa, quando da sua criação pelo prefeito Cleovansóstenes Pereira de Aguiar, em 17 de março de 1973, por ocasião do 118º aniversário da transferência da capital de São Cristóvão para Aracaju. Foram seus pares o expoente da cirurgia em Sergipe, Dr. Augusto Leite, o professor renomado Dr. Joaquim Sobral, o farmacêutico-químico e fundador da Escola de Química de Sergipe, Antônio Francisco Tavares de Bragança, o historiador Epifânio da Fonseca Dória, o escritor e membro da Academia Sergipana de Letras, José Sebrão Sobrinho. A cerimônia, realizada na praça pública Inácio Barbosa, contou com a presença de autoridades estaduais e municipais, entre as quais o então deputado Heráclito Rollemberg.
O Dr. Antônio Garcia falou em nome do povo, fazendo a apologia dos homenageados. A respeito de Cezartina Regis de Amorim, ele disse: “Estamos exaltando a mulher sergipana, na pessoa de Cezartina Regis de Amorim, a primeira farmacêutica sergipana, líder feminista na sua época, fundando o Clube Feminista de Aracaju e o Clube de Esperanto, a nova língua universal que se propunha a unir povos. Foi também sócia funda­dora da Hora Literária, semente da Academia de Letras. Vencer barreiras, exercer a função pública de Inspetora do Serviço de Fiscalização de Farmácias, educando farmacêuticos, médicos, dentistas, proprietários de farmácias a aceitarem o controle e a lei na defesa do povo e da Nação. Maior zelo não poderia existir.
Os entorpecentes, sobre promoverem tolerância, impõem dependência, fonte de viciados. De tal forma que o problema não é apenas de ordem psicológica ou psíquica, mas, sobretudo, orgânica, cuja abstinência leva o toxicômano à compul­são de adquirir a droga por qualquer preço, despersonalizando-o gradativamente até a ruína total ou, ainda pior, levando nas aspirais das ilusões, ingênuas criaturas, tornando-se um mal social. O trabalho de Cezartina Regis de Amorim em defesa da comunidade, justificaria por si só a coroa da glória.”

Palavras de agradecimento proferidas pela Farmacêutica Cezartina Regis de Amorim:
“Senhoras e senhores,
É perfeitamente justificável a distinção que me coube de, por mim e por meus companheiros, agradecer a significativa homenagem que vimos de receber.
Firma-se naquela fidalguia que sempre caracterizou os cavalheiros de cederem o lugar de honra à mulher, talvez como tributo de respeito e de apreço àquela que sublima em dignidade e amor, na sua mais bela e expressiva missão de Mãe!
O que é difícil de entender e que me surpreende é estar ao lado de personagens que se impõem ao conceito de todas as gerações, pela vida totalmente empregada em favor da comunidade!
Augusto Leite, diante do qual todo o Sergipe se curva, pelo complexo de atividades marcantes, médico, o primeiro a usar o bisturi para as grandes cirurgias, fundador do Hospital das Clínicas “Dr. Augusto Leite”, abran­gendo a Maternidade “Francino Melo” e o “Hospital Infantil”; da Escola de Auxiliares de Enfermagem “Dr. Augusto Leite”; da Sociedade Civil Faculdade de Medicina de Sergipe; da Casa Maternal “Amélia Leite”. Homem público, professor do ensino profissional oficializado, implantado em Sergipe e quantas outras realizações que laureiam seu nome já consagrado!...
Epifânio Dória, o zelador inigualável da Cultura e da História de Sergipe, num exaustivo e perseverante trabalho de adquirir, colecionar, guardar, conservar, para depois oferecer à sua gente e a quantos desejem, fontes de pesquisas e de conhecimentos, naquelas casas tradicionais do saber, Biblioteca Pública do Estado e Instituto Histórico e Geográfico de Sergipe.
Antônio Tavares de Bragança, meu conterrâneo, meu ex-aluno, meu colega e, de tudo isto, só resta o termos aberto os olhos sob um mesmo céu, porque, no mais, tanto se avantaja, que se tornou meu mestre, presenteando o Estado com a Escola de Química, que se acredita no país inteiro, não desmentindo, assim, na inteligência e no trabalho, a procedência do “Doutor Bragança, esse varão laranjeirense”, como se intitula a biografia de seu ilustre pai, traçada com a precisão da verdade e com o carinho do afeto, por seu sobrinho Dr. Camerino Bragança de Azevedo.
Joaquim Sobral, que tanto se distinguiu na cátedra como na direção do “Ateneu Sergipense”, o educador firme e sereno, compreensivo e justo, abnegado e generoso, conseguindo, por todos estes valores, reunir, em torno de sua velhice veneranda, a mocidade estudiosa agradecida aos seus extraordinários dotes de mestre e orientador!...
Sebrão Sobrinho, cujo nome pronuncio com respeito e admiração, aqui presente, sim, pela saudade e pelo reconhecimento, o arquivo precioso das tradições de Sergipe e dos sergipanos!...
Quanto a mim, senhores e senhoras, só me com­pete auferir as vantagens da diretriz segura de minha inesquecível mãe, que me ensinou, sobretudo com o exemplo, a enfrentar a vida em sociedade e no lar, com coragem e dignidade, e a meu pai, meu heroico pai, homem pobre que, sem qualquer auxílio público ou de entidades assistenciais, somente com o trabalho honesto, fez vir do Rio de Janeiro para Sergipe sua primeira farmacêutica. E o que se seguiu em todo o estender de minha existência, outra causa não foi, senão um procedimento de rotina como qualquer pessoa que se firma na fé e na razão, caminhar sobre uma pauta, que se chama cumprimento do dever!
Sinto-me verdadeiramente emocionada ao receber tão honrosa homenagem do município de Aracaju, porque se nasci na querida terra de Laranjeiras, se ali recebi a base de tudo que pude aprender, depois, nas aulas primárias das professoras Clotildes Muniz Teles e Maria da Glória Chaves, se meus pés travessos de criança se molharam nas águas do Tramandaí, subiram e desceram com a agilidade que lhes era própria, nas apostas com outras amiguinhas de infância, os morros do Bom Jesus dos Navegantes, do Senhor Bom Jesus do Bonfim, da Boa Vista e do sítio de Santaninha, saboreando as adocicadas jaboticabas que marginavam o caminho da mansão Antônio Agostinho Ribeiro Guimarães aquele em que se assenta a tradicional Capela do Menino Jesus, e se hoje, sob o peso dos anos vou e volto, não mais com os meus cansados pés, mas pelos meios da civilização, com o coração magoado em visita aos restos mortais do meu par, que repousam, a seu pedido, junto ao altar de Nossa Senhora das Dores, na Igreja do Bonfim, foi aqui, em Aracaju, que firmei os passos para avançar, lutar e vencer, no meio deste povo hospitaleiro e bom, sobre quem meu coração se inclina, numa reverência de amor sincero e de profunda gratidão.
Cabe-me, agora, desincumbir-me da honrosa missão... agradecer e agradecer por todos que sentimos o calor da vossa generosidade, as presenças ilustres das Autoridad­es civis e militares, ao Dr. Antônio Garcia Filho, que nos brindou com tão eloquentes e emocionantes palavras, bem próprias de sua inteligência fecunda, de sua cultura sólida e da distinção de suas maneiras, a todas as representações dos que integram a alavanca do progresso, no desempenho de suas atividades específicas, à mocidade estudantil, à imprensa falada, escrita e  televisionada, aos amigos, a todos, enfim, enquanto recolhemos as mãos de nossos familiares, para sentirem uníssonos aos nossos corações, as alegrias e as emoções deste dia!...
Dr. Cleovansótenes Pereira de Aguiar, o prefeito que a visão administrativa do governador Paulo Barreto de Meneses escolheu para, em concerto com o seu plano de trabalho por Sergipe, dar a Aracaju o de que ela precisa no momento e do preparo para o amanhã.
Quis V. Excia., de um modo todo especial e inédito, assim podemos classificar diante deste espetáculo, comemorar o segundo governo no município de Aracaju com a cerimônia que ora se realiza.
Este procedimento simpático e confortante para nós é bem uma característica de seu cavalheirismo e de sua aprimorada formação cristã. Descentralizou-se das homenagens justas e merecidas que lhes são tributadas e foi buscar os velhos para apresentá-los aos moços, como participantes do que só a V. Excia. caberia receber. Como educador, reverencia o trabalho e o sacrifício dos que contribuíram, com maior ou menor parcela, segundo a capacidade de cada um, mas sempre contribuindo para o bem da coletividade.
A Medalha do Mérito Cultural “Inácio Joaquim Barbosa”, que V. Excia. fez gravar pelos “relevantes serviços prestados ao município de Aracaju”, traz, no metal que não se destrói, o seu gesto delicado, altamente expressivo e generoso, que não se corrompe com o tempo, como a nossa gratidão que se eterniza.
Obrigado, Dr. Cleovansóstenes de Aguiar, muito obrigado à pessoa gentil de V. Excia. e ao prefeito que, atualizado, dá no presente o que ele requer à cidade que administra; idealizador, prevê o seu futuro; e conservador, volve os olhos para trás, para encontrar mérito nos que já passaram.”

FALECIMENTO

Prezados colegas:
Com pesar registramos o falecimento ocorrido em 15 de fevereiro último, da nobre farmacêutica Cezartina Regis de Amorim.
Difícil tentar transmitir o muito do trabalho desenvolvido pela saudosa colega.
Formada pela então Faculdade de Medicina e Farmácia do Rio de Janeiro, em 2 de dezembro de 1911, iniciou sua atividade profissional na cidade de Estância, Sergipe, na Farmácia “São José”, sendo também nomeada farmacêutica da Penitenciária do Estado.
Por Decreto de 29 de maio de 1931 foi nomeada para assumir as funções de Farmacêutico Inspetor do Centro de Saúde de Aracaju, com atribuições em todo o Estado, quando organizou o Serviço de Fiscalização em Sergipe, dando prioridade à fiscalização farmacêutica. Substituiu o Inspetor da Área de Alimentos entre julho de 1931 e agosto de 1932, sem nenhuma remuneração, tendo deixado o cargo a pedido.
Posteriormente ficou à disposição da Interventoria Federal, como também da Secretaria Geral do Estado, em comissão de Inquérito, de 16 de novembro de 19 a março de 1943.
Foi eleita e empossada Conselheira Efetiva do CRF-17/SE, quando da constituição do seu primeiro Plenário, em 20 de dezembro de 1962, com mandato de três anos.
Na mesma data (20/12/62) foi eleita Presidente daquela regional, tendo como Vice-presidente o Dr. Marcos Ferreira de Jesus.
Presidiu o CRF-17/SE ainda nos anos de 1963 e 1964.
Foi reeleita Conselheira por dois mandatos: um de 1965 a 1967 e outro de 1971 a 1973, tendo presidido a Regional nos anos de 1965, 1966, 1967 e 1971.
Mais difícil ainda, esquecê-la pela dedicação e espírito humanístico com que sempre procurou tratar seus semelhan­tes, respeitando a nossa profissão.
Da Gazeta de Farmácia, editada em São Paulo.

Ainda como profissional de Farmácia, a doutora Cezartina Regis fundou a Associação Farmacêutica de Sergipe, ao lado dos colegas Pedro Garcia Moreno, Francisco Alberto Bragança de Azevedo, Marcos Ferreira de Jesus, Ephrém Teles e Maria da Glória Leite. Foi secretária e presidente da Entidade. Quando do seu falecimento, já era Presidente Honorária. É fundadora do Conselho Regional de Farmácia – 17/SE, o qual dirigiu durante dois anos, fazendo-o funcionar em sua própria casa, durante esse tempo. Depois alugou duas salas de uma casa residencial onde instalou o CRF. Ao afastar-se da Presidência deixou os recursos necessários para a compra de uma sede o que foi realizado na administração do Dr. Marcos Ferreira de Jesus.
Foi aposentada no cargo de Farmacêutico Inspetor por Decreto de 19 de agosto de 1955, com tempo integral de serviço.
Era sócia efetiva de todas as Associações de Farmácia do país.
Homenagens que lhe foram conferidas:
·  Com unanimidade de votos recebeu o grau de Titular Correspondente, em Sergipe, pela Sociedade de Farmácia e Química de São Paulo;
·    Diploma de Membro Efetivo da X Convenção Brasileira de Farmacêuticos de Porto Alegre;
·   Certificado de Outorga da Medalha Comemorativa do VII Congresso Brasileiro de Farmácias em Recife.
Participou de vários congressos farmacêuticos, tomando assento à mesa como relatora e muitas vezes presidindo a sessão. Recebeu homenagem da Gazeta da Farmácia na coluna “O Farmacêutico do Mês”, editado no Rio de Janeiro. O Museu de História e Arte “Rosa Faria” apôs o seu retrato em louça na galeria como a primeira farmacêutica. No bairro Sol Nascente, em Aracaju/Sergipe existe uma avenida com o nome da  Farmacêutica Cesartina Regis.
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Do Livro: A Mulher na História, de Maria Lígia Madureira Pina.