(1890-1976) |
Ela era bela, inteligente e apesar da idade o seu semblante irradiava uma perene juventude. Era o reflexo da sua alma impoluta, de consciência tranquila de quem viveu espargindo luz, no dia a dia de sua longa vida, cumprindo religiosamente a missão a que se propôs.
Morando na mesma rua, alguns trechos acima, eu passava todas as tardes à sua porta e fazia questão de cumprimentá-la. Sabia que ela era D. Leonor Telles de Menezes, catedrática de Português da Escola Normal “Rui Barbosa”, mas já aposentada. Não era por isso, entretanto, que eu gostava de lhe falar. É que da sua venerável pessoa irradiava uma beleza serena, uma simpatia, um carisma tão grande que me tocavam o coração. Alguns anos mais tarde, coincidiu que vim a ser sua vizinha e em um momento muito difícil da minha vida. Havia perdido minha mãe e me sentia só no mundo. Foi quando conheci a generosidade da alma de D. Leonor e a grande amiga que ela sabia ser. Ela e sua irmã, D. Dulce, foram dois baluartes, duas colunas que me ampararam, diminuindo, com a sua solicitude, o travo imenso da minha dor. Tanto que eu sempre lhes dizia: a minha única alegria, depois da morte de minha mãe, é tê-las perto de mim. Conversávamos horas a fio; ela era um manancial inesgotável de conhecimentos de literatura, sociologia, folclore etc. Contava-me histórias e estórias de Aracaju antigo, o Aracaju da sua juventude, os bailes que frequentava, inclusive as festas palacianas da época, principalmente, no Governo do Dr. Graccho Cardoso, de quem era afilhada.
Relembro, agora, do que ela me falou sobre uma festa no Palácio, no governo do General Siqueira de Menezes. A mulher dele, Donaninha, era muito orgulhosa e considerava o povo aqui de Sergipe, como gente inculta, indigna do seu convívio. O general resolveu dar um baile, sem dúvida contra a vontade da mulher. O Palácio encheu-se de convidados e na hora do baile, Donaninha não apareceu. O anfitrião apresentou desculpas, dizendo que ela estava adoentada. Os convidados receberam a ausência da anfitriã como uma afronta; pouco a pouco, foram se retirando e a festa, praticamente, não aconteceu.
Um dos “hobbies” de D. Leonor era fotografia. Mostrava-me os álbuns da família, nos quais ela e sua irmã, em fotos sépia ou preto e branco aparecem belas, trajando como verdadeiras princesas. Outro “hobby” de D. Leonor era viajar. Levava-me sempre a seus passeios pelo interior do nosso Estado, dando-me a oportunidade de conhecer várias cidades do nosso “hinterland”. E sempre tinha algo interessante a contar sobre o local que visitávamos.
Conversando, D. Leonor ensinou-me muitos dos inúmeros segredos do nosso idioma. Em caráter informal recebi, aulas encantadoras de semântica e etimologia. Aquela mulher admirável rebuscava na língua mãe – o latim – as famílias das palavras e eu bebia na fonte do seu saber. E ainda lia atentamente meus trabalhos, criticava-os e os corrigia, estimulava-me com suas apreciações entusiásticas a escrever e aperfeiçoar as minhas composições em História ou literárias.
D. Leonor escreveu muito, mas muito pouco guardou do que escreveu. Muitos discursos elaborados para outras pessoas falarem, palestras, sem nunca receber dinheiro em troca. Ela também era poeta. Um dos últimos poemas que compôs intitula-se Meu Bandolim. Tocando o velho bandolim ela o declamou em um dos nossos saraus literários para que eu o gravasse.
Poetisa lírica e mística escreveu muitas poesias que se perderam no tempo. Outras ela conservou em um álbum, primorosamente desenhado, Consegui com a sua sobrinha Ruth, residente em Recife, as que agora reproduzo:
MEU BANDOLIM
Para Dulce
Companheiro das horas de bonança,
De minha esplendorosa mocidade,
De lindos sonhos e de áurea esperança,
Eras um hino à minha felicidade.
Com tuas melodias e trinados
Tu me alçavas aos paramos do amor,
E teus “glissés” e arpejos combinados
Ecoavam, assim, como um louvor.
Revivias Gounod, Schubert, Silvestre,
Interpretando suas serenatas
Preciosa inspiração de cada mestre
E ouviam-se com ternura essas oblatas.
Meu leal e sincero confidente,
Em silêncio escutavas meu anseio.
E, após, desferias meigamente,
De melodias turbilhões em cheio.
As agruras da vida a suavizar,
Com teus quebros e sons harmoniosos,
Acompanhavas-me a dulcificar
A saudade... os espinhos dolorosos...
Compartilhavas assim das alegrias
Que a juventude prodigalizava,
E comigo, as tristezas tu sentias,
Enquanto tua voz me acalentava.
– Por que agora, assim, emudeceste?
– Por que não mais acordes a toar?
Das ilusões e sonhos te esqueceste,
E não mais te ouvimos modular.
Desfere, então, o canto da saudade,
Pra mitigares este padecer,
E, envolta em suavidade,
Ao passado feliz, retroceder.
INDECIFRÁVEL
Tenho medo de ti! Mas, ai! Quem dera
Viver sempre a teu lado!
Acarinhando, assim, essa quimera,
Procuro te encontrar, meu bem amado.
Tenho medo de ti! Mas em teus beijos,
Sorver quisera perenal ventura...
Inflama-se em desejo
Meu triste peito, fruindo tal doçura.
Tenho medo de ti! Mas de teus olhos
Os fluidos ardentes,
Como lindos faróis, entre os abrolhos,
Desejo tê-los sempre incadescentes!
Tenho medo de ti! Mas te beijando,
Na febre ardente de voraz paixão,
Tua fronte pousando
Sobre o meu pobre e triste coração.
“Não tenho medo mais”, assim direi,
“De ti, ó meu amado!”
“Aperta-me em teu peito e sentirei
Reviver-me o coração dilacerado.”
QUEIXAS
Já o dia desmaia. As trevas descem
Ora, uma estrela trêmula reluz,
Depois, milhares delas resplandecem,
Ourificando a abóbada de luz!
No céu, a lua plácida açucena,
Namorada de místicos cantores,
Desliza, na amplidão, bela e serena!
Risos fagueiros, como beija-flores,
Modulam pelo espaço seus amores.
Revejo teu perfil saudosamente,
Enquanto o coração se esvai em dores.
MINHA PRECE
Ó Cristo, Redentor da humanidade!
Ante o teu vulto belo e majestoso,
Curso os joelhos meus com piedade,
Sempre a esperar o teu olhar bondoso.
Olha-me e de tua alma pura
Deixa vir a mim um raio de amor!
De teus sagrados lábios a ternura
Que eu a ouça sempre a suavizar-me a dor.
Bem vês, quanto padeço. Pra este sofrer
Imploro com veemência tua graça.
Se não ma concedes, este padecer
Jamais no coração se adelgaça.
Ouve-me as preces, meu amado Cristo!
Afasta bem de mim esta ilusão!
Se me abandonas, sei que não resisto,
Cederei fatalmente ao coração.
ALEGRIA FUGAZ
Como a criança tímida e medrosa,
Do pássaro que voa, além do espaço,
Oculta, toda trêmula e chorosa,
A fronte pura, em maternal regaço;
Como a avezita implume e descuidosa,
Sob as asas maternas tem abrigo...
Assim quisera eu ser tão ditosa,
Para em teu coração viver contigo,
Sem sustos, sem receito desta lida,
Confiando, feliz, no meu porvir,
Sem mágoas e sem a alma dolorida.
E talvez, dessa visão muito querida
Possa surgir pra mim, com esse sentir,
A alegria fugaz da minha vida.
RECORDANDO...
Ao te ver, à vez primeira,
Eras vida em botão,
Desabrochando, feiticeira,
Ao sabor da viração.
Veio, então, a primavera...
Transformou-te em linda rosa!
E, assim, desde essa era,
És mui bela e mui formosa.
E a minha alma deslumbraste
Com teu puro e casto olhar,
Com teu riso me encantaste,
E quedei-me a te adorar!
Meu amor correspondido
Fez de mim feliz mortal!
Agora, desiludido,
Te procuro pelo val...
Eu tenho n’alma um espinho,
É da saudade o dulçor,
Que fere, bem de mansinho,
E tem perfume de flor.
É também recordação
De tuas juras de amor,
Ao fremir do coração...
Sob suave dulçor!
Se algum dia, esse amor
Ressuscitar em minha vida,
A querer-te, com ardor,
Entre carinhos, ó querida,
Serei, assim, tão venturoso,
Ao teu lado, ó minha fada!
E o teu rosto mui formosa...
Um tesouro, ó bem amada!
QUADRO
A Maninha
É noite. Chove. Lá fora,
Da lua o brilho se empana,
O vento geme raivoso,
Na areia o mar se espadana.
Numa casa pequenina,
Coberta só de sapé,
Abençoada família
Reza baixinho, com fé.
Os tenros filhos mimosos
De olhos fitos na cruz,
Rogam a paz, saúde e vida,
Para os pais, ao bom Jesus.
A avozinha curvada,
Ao peso da muita idade,
Orando, expressa na face
Serena felicidade.
Em tudo existe carinho,
Vê-se a ventura no lar,
Contrastando firmemente
Com os rugidos do mar.
.........................................
Não é somente a riqueza
Que nos dá ventura, não!
Basta trazermos no peito
Um sincero coração.
FOLHA VERDE
Folha verde, desgarrada
De majestoso arvoredo,
Vais rolando pela estrada,
Em procura de um segredo...
Ouviste-e, em noite clara,
Sob os raios do luar...
Aos lábios vinha, da alma
De alguém triste a soluçar.
Ó folha verde caída,
Desses galhos orvalhados,
Pelos ventos impelida
Por caminhos ondulados,
Folha verde, enlouqueceste?
O segredo? Que ilusão!...
A teu destino cedeste,
Fenecendo o coração.
HOMENAGEM FILIAL
A uma aluna
Tu és bondosa, gentil
Que ao berço meu entoaste
Doce arpejo, em voz sutil...
E o meu sono acalentaste.
És assim toda doçura,
A desejar-me feliz,
A embalar-me com ternura,
Minha existência bendiz!
És também ente querido,
Anjo, fada, a me guiar,
Pelo caminho florido
De minha vida, a cantar!
És amiga inigualável,
Teu lema é sinceridade.
Tão gentil e tão afável,
Tu me dás felicidade.
Neste dia, esplendoroso,
A ti, mamãe, consagrado,
Em teu coração bondoso
Registro meu voto alado:
Ó Mãe de Deus piedosa
Daí a mamãe adorada
Longa vida e venturosa
Por Vós seja abençoada.
SAUDAÇÃO A BEBÉ FONTES
(Para uma orfãzinha)
Mãezinha:
À hora da despedida,
Que podemos te ofertar?
Que te diremos, Mãezinha,
Pra tua alma consolar?
Que viverás na lembrança
De nossa firme amizade,
Enchendo nossa existência
De amena e doce saudade?
Que serás um grande exemplo
De Fé, Amor, Caridade,
Nosso Guia espiritual
Pela trilha da Verdade?
São João Bosco, milagroso,
De bênçãos e alegrias
Conceda a ti grande messe,
Pois ao bem nos conduzias!
Eis tudo o que a ti desejo,
Em ritmos do coração.
Por todas aqui externo
Nossa eterna gratidão.
MEU CANTAR
Sou da terra brasileira
Da nobre tribo Tupi
Sou cabocla, sou guerreira,
Amo o sol, amo Jaci.
Quando o dia vem surgindo,
Deixo a oca em alegria,
Vou pelas matas sorrindo
E me lanço na água fria.
Mergulho, nado, contente,
Esquecendo meu sofrer,
Estando sempre na mente
Saudade do benquerer.
A ouvir os passarinhos,
Sinto brotar a esperança,
Ressurgindo destes ninhos,
Em doce, terna lembrança.
Sou cabocla do Brasil,
Da heroica tribo Tupi,
E, sob este céu de anil,
Canta, canta a juriti.
Sou cabocla do Brasil,
Amo a gente e este rincão
Amo a selva, o alcantil,
Com fervor, com efusão!
MULHER PERFEITA
A Dulce
Que coração mais terno e mais
Alma plena de tão raras virtudes,
Qual mais firme criatura, mais constante
Se não tu, que és sincera e não iludes.
És emblema da mulher perfeita
Filha, ou irmã, amiga dedicada,
Sempre de nossos corações a eleita,
Por eles muito e muito abençoada.
Recebeste de Deus esta missão;
– Esposa devotada e exemplar –
Cumpriste-a com valor – abnegada –
A saudade te vela o coração.
O esposo adorado a prantear!...
Mas serás por teus dotes bem fadada.
UM SEGREDO
A Ninguém
Deste cantinho,
Devagarinho,
Conto um segredo.
Até, com medo,
De te falar!
É pequenino,
Mas, tão menino,
Faz travessuras
E diabruras
De amedrontar!
Este segredo
Me causa ledo
Grato prazer!
Vou-to dizer...
No ouvido, não!
Mas tem cuidado!
Guarda-o calado,
Com mui carinho,
Bem unidinho
Ao coração.
Ei-lo que enflora,
À luz da aurora,
Os lábios meus!
Mas, como os réus
Volta à prisão!
Fica detido,
Entristecido
Com a dura sorte,
Que outro norte
Lho mostra então!
Guardo o segredo,
É muito cedo
Pra to dizer...
Mas... que fazer?
– Ouve-o, senhor:
(E, neste instante,
‘Stou ofegante!)
– Juro, não minto,
Por ti eu sinto
Sincero amor!
NÃO QUEIRAS MAIS AMAR
– Por que, coração meu, terno e sensível,
Estás sempre a palpitar?
Anseias, nesta vida, um impossível
Que não hás de alcançar?
– És louco? Coração, não pulse tanto,
Acalma este sofrer!
Para longe de ti, sacode o manto
Deste teu padecer.
– Não queiras, sonhador, nesse delírio,
Definhar e morrer...
Oculta em teu âmago tal martírio,
E procura vencer...
Vencer tão grande amor, esta afeição,
Que te vem a matar,
É uma luta cruel, ó coração!
Não queiras mais amar!
De tua consciência ouve-lhe a voz,
E domina este amor!
Terais com ela, segredando a sós,
Lenitivo a essa dor.
Com as luzes de teu cérebro verás
Que este amor é ilusão!...
É cedo ainda, foge e alcançarás
Pra este amor o olvido, ó coração!
Não ouves, coração desventurado?
Estás a soluçar?
Enfrenta a sorte tua e o teu fado...
Não queiras mais amar!
CRIANÇA!!!
À querida Otanina Brito
És o emblema da vida,
És o símbolo do amor!
Tua inocência, querida,
Brilha em teus olhos, ó flor!
Quem não goza da ventura
De teu sorriso, menina,
Da meiguice e da candura
De teus lábios, Otanina.
É pobre dos bens terrenos,
Não possui esta riqueza
Que de teus olhos amenos
Emana com singeleza.
Saudando a ti, neste dia,
Consagrado em teu louvor,
Desde que o sol refulgia,
Cheio de grande esplendor.
Roguei a Deus, ó criança,
Que te dê felicidade,
Que fruas grande bonança,
E cultives a bondade.
PREDIZENDO
A Virgínia
V agas, sonoras, pelas praias, ao sul!
I mersa em níveos raios dorme a terra!
R aros perfumes balsamizam a terra,
G aivotas voluteiam pelo azul!
I ncanta, bem travessa, uma avezinha,
N a fronde exuberante fez um ninho,
I nda há pouco vazio... é já um ovinho
A li se vê na casa benfeitinha.
M enina, és como um frágil passarinho:
I rás alegre, em amigo peito,
R aros perfumes, suaves rosmaninhos,
A ssim teu coração, bem satisfeito,
N a vida, entre segredos a cantar
D o amor – o deus – travesso e bom menino
A s melodias terás a te afagar.
À VIRGEM MARIA
Doce Mãe de meu Jesus,
Das dores celeste orvalho,
Coração cheio de luz,
Onde há paz e agasalho.
A Vós, Lírio Imaculado,
Nesta sublime bandeira,
– Emblema de Amor Sagrado,
E de esperança verdadeira.
Em sua inauguração,
Porque sois nosso farol,
Louvamos com efusão,
A Vós, resplandecente Sol!!
(Lembrança da inauguração da Bandeira da Consagração
das Filhas de Maria, da Matriz, da cidade de Laranjeiras.)
das Filhas de Maria, da Matriz, da cidade de Laranjeiras.)
MARIA, NOSSO AUXÍLIO
Excelsa Virgem Maria,
Conforto, fulgente Estrela,
Que farolizas a estrada
Do Dever e Caridade,
Virgem Mãe Imaculada,
De graça cheia e ternura,
Em tua sublimidade
Amparas a criatura
E, destarte, queres tê-la
Em teu seio, Virgem pura.
Maria Auxiliadora
Fonte do Amor e da Fé
Coração alcanceado
Com o martírio da Cruz,
Em teu pranto amargurado,
Por teu divino Jesus,
Acodes ao sofrimento:
– És auxílio, esperança,
Seja qual for o momento
Vem de ti toda bonança.
Senhora Auxiliadora,
Lírio puro, alvinitente,
Cujos braços são suporte
Do pequenino Jesus,
Ouve a este penitente.
– Bendize as Salesianas
Da pia congregação
Onde teu nome reluz,
Pra que gozem primazia
Na edificante missão.
REMINISCÊNCIAS
A Florentino
Do céu azulado,
De estrelas juncado,
A luz prateia,
Redonda, bem cheia,
Os campos e o mar.
A terra orgulhosa
Ostenta, garbosa,
Seus prados banhados
(E já orvalhados.)
De belo luar.
O rio, ondulando,
De lótus formando
Um alvo e brilhante
Lençol fulgurante,
Sereno fluía!
Em célere canoa,
Cantava uma loa,
Olhando as estrelas,
Um velho que, ao vê-las,
De gosto sorria.
Lembrava o passado,
O tempo em que amado,
Sentia-se forte
E cheio de sorte
Pra via, pra o amor!
E, na face trêmula,
Uma gota quérula
Dos olhos desliza!...
Ao sopro da brisa,
Ressurge uma flor!...
A flor da saudade
Que lembra a idade
Dos seus vinte anos!...
Cruéis desenganos
Pra o seu coração!
Agora, sozinho,
Sem ter o seu vinho,
Cercado de flor,
De risos, de amor,
Entoa a canção:
– Ó tempos ditosos
Em que, venturosos,
Nós dois ao luar,
Eu disse te amar
Pra sempre na vida,
Tu deste, formosa,
A face mimosa,
Com muito receio...
E eu, num anseio,
Beijei-te, querida.
Ó tempos felizes,
De belos matizes,
Ornado de amores,
Quão longe que estais!
Que intensa saudade
De tão linda idade,
De ti, ó formosa,
Da quadra ditosa
Que não volta mais!
NÃO TARDES!
A você, sonhadora...
Meu bem escuta: – No espaço
Docemente reclinada,
A lua os raios derrama
Sobre a terra, bem fadada.
Enquanto no giro eterno,
Prateia os campos e as flores,
Recostada na janela,
Cismo e penso em meus amores...
Penso em uns velhos brilhantes,
Olhos lindos de encantar
Que me prometem o céu
E me convidam a amar.
E, num enlevo feliz,
Vejo em ti, ó doce amor,
A ventura da existência,
A as espero, com fervor.
IDEAL
A ti, caboclo do meu Brasil
Era assim o ideal com que sonhei!
Tudo nele reflete esta magia!...
Seu caráter altivo, forte espírito,
Alma sensível... tudo me faria.
Escravo o coração... Quanta ironia!
Por que, meu Deus, assim, esta paixão?
Por que sentir indômita afeição
Por ele que, talvez, de mim sorria?...
És tu, Senhor, que une almas aos pares?
Que conjugas dois seres pelo Amor?
Quem as chagas e dores alivia?
Leva de mim, bem longe, esta loucura,
Ou deixa meu sofrer se amenize
Em teu lúcido olhar... Oh! Que ventura!
PÁLIDA PRINCESA
No espaço infindo, a luz resplendia
Como uma triste e pálida princesa!
E os montes, vales, tudo lhe sorria,
Namorando-lhe a plácida beleza.
Em seu manto real ela envolvia
Doces promessas e os beijos de amor!
E as almas crentes, em melancolia,
Segredavam-lhe juras, com fervor.
..................................................
Nos raios merencórios do luar,
Quanto sonho fugaz, quanta ilusão!
E se desfazem pela dor de amar
Devaneios sentis do coração!
Eu te contemplo, ó Pálida Princesa!
E, num fio de prata de teu manto,
Envio a quem adoro, com firmeza,
As pérolas cristalinas do meu pranto,
Lágrimas puras do meu coração,
Lenitivo eficaz desta paixão.
EMOÇÃO
A Maria Dulce
Aos sons vibrantes de uma valsa lenta,
Naquela noite... Tão formosa e calma,.
Do teu olhar os raios cintilantes
Docemente gravaram-se em minha alma.
Senti seu hálito bafejar-me a face,
O teu semblante pálido, risonho,
Bem perto ao meu... E num transporte ameno,
Errei, feliz, pelo País do Sonho.
....................................................
Grata recordação eu te conservo,
Dentro, bem dentro, do meu coração!
Foram instantes de fugaz ventura,
– Voos de Amor, ao Mundo da Ilusão.
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Do livro “A Mulher na História” de Maria Lígia Madureira Pina