Lido durante reunião de aniversário de Leyda Regis (23.02.97).
Maria Lígia, Leyda Regis e Rosa Faria - Foto Shirley Rocha |
Ângela Margarida Torres de Araujo
Recordo-me que não faz muito
tempo, encontrava-me participando de uma das deleitosas tardes de enlevo
cultural sob o patrocínio da Academia Literária de Vida, respirando não só a
intelectualidade daquele Liceu móvel, instalado, na ocasião, numa fresca
varanda residencial, na Rua de Maruim n. 957, com o aroma dos jasmins alvacentos,
responsáveis pela beleza daquele lugar.
Gozava do privilégio, naquela
reunião vespertina, de ter ao um lado, a Cadeira Madre, cujo assento ocupava a
acadêmica anfitriã, decana dos tempos áureos do magistério sergipano.
Agora já caía a tarde,
chamando-nos à hora das despedidas e, não somente eu, mas todas as
companheiras, haveríamos de expressar a nossa gratidão pela amorosa acolhida e
pelos belos instantes que desfrutamos juntas.
Desfilando, uma a uma, entre
palavras e afetos, nos reclinávamos para cumprimentar a soberana figura que
sorria feliz pela nossa estada em sua casa. Até que chegou a sua vez de
expressar-se. Para ouvi-la, sentei-me novamente como um discípulo diante do seu
Mestre. “Dos seus lábios então, ouvimos uma expressão que tentarei repeti-la na
sua íntegra e que é o motivo desta reflexão: “Eu não tenho mais pernas; eu não
tenho mais braços; só tenho um coração para amar e agradecer o carinho de
vocês”.
Enquanto ela falava, analisei o
físico daquela venerável senhora e com os olhos clínicos, vi no seu corpo uma
fragilidade tal que me moveu a admirá-la mais ainda. Em seguida repensei
Exupéry: “... o essencial é invisível aos olhos...” e daquela cadeira vi
perfilar-se a coragem, a força, a vida. Exuberantes.
Para mim, que olhava de perto, a
sua impossibilidade física era apenas um acidente. Porquanto, naquela hora, ela
estava de volta ao lar, para o descanso natural da noite, à semelhança dos que
laboram. E no dia seguinte, usaria novamente suas pernas e os seus braços para
o trabalho tão amado.
Sim, Dona Leyda Regis, este
preâmbulo objetiva dizer que a senhora ainda possui pernas e braços, porque
realmente dentro do seu peito pulsa um coração que é uma cátedra de amor e
abnegação. A senhora possui, sim, pernas e braços. Porque a senhora é detentora
de uma mente extraordinária e lúcida, que ainda exorta e ensina. A senhora
possui pernas e braços, professora, porque é remanescente da Escola que
disciplinou para educar; que passou conhecimento para formar; que trabalhou a
criança para ser homem. Porque circunstância alguma apaga as pisadas de um
Mestre.
Ah! D. Leyda! Estas pernas e
estes braços que a senhora diz não tê-los, são pilares. E plagiando um velho
ditado egípcio*, os pilares não têm medo do tempo, posto que foram erguidos
para desafiá-los.
Aceite meu carinho de aluna, no
seu aniversário.
* Todo mundo medo do tem tempo;
mas o tempo tem medo das pirâmides “- ditado egípcio.