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sábado, 23 de fevereiro de 2013

Em homenagem


Lido durante reunião de aniversário de Leyda Regis (23.02.97).


Maria Lígia, Leyda Regis e Rosa Faria - Foto Shirley Rocha

Ângela Margarida Torres de Araujo

Recordo-me que não faz muito tempo, encontrava-me participando de uma das deleitosas tardes de enlevo cultural sob o patrocínio da Academia Literária de Vida, respirando não só a intelectualidade daquele Liceu móvel, instalado, na ocasião, numa fresca varanda residencial, na Rua de Maruim n. 957, com o aroma dos jasmins alvacentos, responsáveis pela beleza daquele lugar.
Gozava do privilégio, naquela reunião vespertina, de ter ao um lado, a Cadeira Madre, cujo assento ocupava a acadêmica anfitriã, decana dos tempos áureos do magistério sergipano.
Agora já caía a tarde, chamando-nos à hora das despedidas e, não somente eu, mas todas as companheiras, haveríamos de expressar a nossa gratidão pela amorosa acolhida e pelos belos instantes que desfrutamos juntas.
Desfilando, uma a uma, entre palavras e afetos, nos reclinávamos para cumprimentar a soberana figura que sorria feliz pela nossa estada em sua casa. Até que chegou a sua vez de expressar-se. Para ouvi-la, sentei-me novamente como um discípulo diante do seu Mestre. “Dos seus lábios então, ouvimos uma expressão que tentarei repeti-la na sua íntegra e que é o motivo desta reflexão: “Eu não tenho mais pernas; eu não tenho mais braços; só tenho um coração para amar e agradecer o carinho de vocês”.
Enquanto ela falava, analisei o físico daquela venerável senhora e com os olhos clínicos, vi no seu corpo uma fragilidade tal que me moveu a admirá-la mais ainda. Em seguida repensei Exupéry: “... o essencial é invisível aos olhos...” e daquela cadeira vi perfilar-se a coragem, a força, a vida. Exuberantes.
Para mim, que olhava de perto, a sua impossibilidade física era apenas um acidente. Porquanto, naquela hora, ela estava de volta ao lar, para o descanso natural da noite, à semelhança dos que laboram. E no dia seguinte, usaria novamente suas pernas e os seus braços para o trabalho tão amado.
Sim, Dona Leyda Regis, este preâmbulo objetiva dizer que a senhora ainda possui pernas e braços, porque realmente dentro do seu peito pulsa um coração que é uma cátedra de amor e abnegação. A senhora possui, sim, pernas e braços. Porque a senhora é detentora de uma mente extraordinária e lúcida, que ainda exorta e ensina. A senhora possui pernas e braços, professora, porque é remanescente da Escola que disciplinou para educar; que passou conhecimento para formar; que trabalhou a criança para ser homem. Porque circunstância alguma apaga as pisadas de um Mestre.
Ah! D. Leyda! Estas pernas e estes braços que a senhora diz não tê-los, são pilares. E plagiando um velho ditado egípcio*, os pilares não têm medo do tempo, posto que foram erguidos para desafiá-los.
Aceite meu carinho de aluna, no seu aniversário.

* Todo mundo medo do tem tempo; mas o tempo tem medo das pirâmides “- ditado egípcio.