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segunda-feira, 4 de junho de 2012

Histórias de Casamento I

Aconteceu há muitos anos. No começo da década de 1930. Numa tarde de sábado, em plena primavera. O dia amanhecera esplendoroso. O sol brilhava intensamente e invadia as residências, iluminando-as, dando-lhes um jato de alegria, de festa. E mais alegre e festiva estava a casa de Dona Verônica: às 18 horas iria realizar-se o casamento de Anete, a Netinha, filha única de mãe viúva. A casa, uma das melhores do bairro, estava toda engalanada. Flores... muitas flores... rosas brancas e chorões de mimo do céu cor de rosa bebê. Na sala de visitas foi armado o altar. Em cima, a imagem da Sagrada Família, relíquia da família. A ornamentação, flores em jarros de finíssima porcelana Limoges. Na sala de refeições, a mesa, com os mais delicados doces e salgadinhos. Tiras de papel crepom branco, trabalhadas nas bordas, desciam do teto, terminando em laço, em cada ponta da mesa. Um encanto!... Um primor!...
A noiva, trancada no quarto, estava sendo adornada por especialistas e amigas. O vestido de cetim e belíssimo gripure francês, rebordado de pérolas. Chegou o juiz e logo depois o padre. Ah!... o casamento seria por procuração. O noivo residia no Sul do País. Tudo pronto! A noiva já saía do quarto pelo braço do irmão. Neste exato momento chega um estafeta e entrega um telegrama. Recebeu-o, o irmão mais novo. Abriu-o. Era do noivo. Leu a mensagem e empalideceu. “Não é possível”, murmurou. Sentou-se, abatido. A mãe acorreu. Tomou o telegrama, leu e desmaiou. Foi um corre-corre dos pecados! Ninguém sabia o que dizer... Finalmente um dos parentes leu a mensagem: “Se o casamento ainda não foi realizado que não se realize. Estou arrependido. Alexandre”. Comunicaram à noiva, que caiu em pranto. A maquiagem virou lama no rosto da pobre moça. Os convidados tentavam consolá-la, mas... o que dizer num momento destes? Resta solidarizar-se, chorando também. Os homens, todos petrificados! O padre e o juiz, estarrecidos! Nunca tinham visto algo semelhante!
DEZ ANOS DEPOIS...
O tempo é o melhor remédio. Cura todos os males. Netinha recuperou-se... Será? Mas a vida se lhe apresentou vazia. Não estudara. Não tinha profissão. Fora preparada para o casamento. Ser boa esposa, boa dona de casa, boa mãe. Tentar outro casamento era difícil. Não confiava nos homens. Também, depois de uma farsa destas!...
Passaram-se dez anos. Eu que naquela época era uma meni¬ninha de cinco anos, era agora uma mocinha de quinze. Já havíamos nos mudado de bairro há muito tempo. Morávamos no centro da cidade. Num fim de tarde meu pai chegou, como de costume, acompanhado do seu irmão. Mamãe lhe ofereceu um café. Ele não aceitou. Por que? Indagou. Porque estou apressado. Eu e Antonia vamos a um casamento de um colega lá do sul. E contou: este casamento deveria ser realizado há dez anos. E foi desfeito por um telegrama do noivo, na última hora. Dito o local e o nome dos noi¬vos, não restava a menor dúvida: era a Netinha, a noiva abandonada ao pé do altar. A moça que não mais acreditava nos homens perdoou e aceitou de volta aquele que a fizera sofrer a dor maior da sua vida. “O coração tem razões que a própria razão desconhece”. Casaram-se e, quem sabe? Como nos contos de fada, foram felizes para sempre.
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