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domingo, 16 de dezembro de 2012

CANTAR DE ARIADNE, de Wagner da Silva Ribeiro

Maria Lígia M. Pina

Teseu abandona Ariadne na ilha de Nexos
Tela de James Herbert Draper
Cantar de Ariadne é o atual lançamento poético de Wagner da Silva Ribeiro. Como outros livros da sua autoria é inspirado na Mitologia Grega. Trata da Lenda do Minotauro de Creta que exigia da submetida Grécia o imposto anual de 14 jovens (sete moças e sete rapazes) para serem devorados pelo monstro. Numa dessas levas foi o jovem Teseu, que já era conhecido e louvado por seus feitos heróicos. Teseu, louro e belo, encantou a filha de Minos, rei de Creta. Apaixonada, Ariadne ofereceu a Teseu o meio de penetrar no Labirinto e matar o Minotauro: um novelo de linha para guiá-lo na ida e na volta e uma lâmpada para clarear o tortuoso caminho. Livre, liberto o povo ateniense, Teseu abandona Ariadne na ilha de Nexos. O beneficiado repudia a benemérita e mais, levando consigo Fedra, irmã de Ariadne. Sozinha na ilha, a jovem princesa cretense entra em desespero, lembrando as falsas juras de amor do seu amado. Chora, soluça até lágrimas não mais ter. e promete nunca mais amar. Mas... de repente se espanta ao se ver pensando em encontrar outro amor, alguém que realmente a ame.
Wagner empresta a sua verve a Ariadne, que exclama:

Cego amor, que tão cedo me atingiste,
ó foi tão curto o tempo de prazer,
não deixes que se estenda o do tormento.
Reacende a chama dos meus olhos e
faz que, olvidando o que colheu primícias,
possa eu viver um novo e longo enleio.
E recobrando a lucidez, exclama:
Mas que súplica é essa, eu ensandeço?
Inda o peito a sangrar e cortinado
o olhar por este pranto tão profuso
que também me reprova a ingenuidade:
inda quando esta dor não merecida
maldiz Teseu e o ódio que secreta
clama aos céus que o fulmine a qualquer preço,
– se nunca mais puder tê-lo ao meu lado.

De repente, ouve música:

Uma longínqua música me chega
Entrecortada pela voz do vento.
Não me parece um canto dissoluto
que já retorne ao seio do silêncio.
Vem num crescendo; ou a minha alma ferida,
desesperada busca um lenitivo.
– Quem sabe, essa longínqua música, – quem sabe,
um adejo divino sobre as mágoas?
– Ao coração falou-me antes que o ouvido a percebesse.

E ela compreende: não foi o acaso que a levou àquela ilha. E ouvia mênades, flauta, tamborim. Diante daquela música, sobe ao monte e de repente, todo o seu pesar, toda a sua dor desaparece, vendo Dionísio dançar para ela. Sem que ordem fosse dada e sem concerto
fez-se silêncio, e um círculo formou-se
em torno de mim e ao deus, que, sem palavras
tanto me disse com o belo sorriso
e um olhar todo de ternura feito.

Estava superada a dor de Ariadne. Todo aquele desfecho havia sido programado no Olimpo... Só um amor cura a dor de outro amor.
E Teseu? Voltou para Atenas tão feliz que esqueceu de trocar as velas fúnebres do navio pelas brancas. E Egeu, avistando as velas negras, supondo que o filho tivesse morrido, atirou-se ao mar que recebeu o seu nome. Sentiu Teseu na carne o seu momento de dor. Mas Cronos se encarrega de fazer passar todo o mal e todo o bem. No fim, toda amargura é saneada. Todo pranto é enxugado.
Encantou-me o Cantar de Ariadne, mais que Os Cantares do Mar Egeu. Talvez porque a dor da princesa de Creta é mais próxima de nós. É dor humana. Dor que nos curva sob o peso de uma grande perda que não necessariamente a do amor entre homem e mulher. Pode ser a perda da mãe, do pai, do filho ou de um bem qualquer. Dor que para ser superada há de encontrar um outro objetivo: veja a mãe do cantor Cazuza. Superou o sofrimento dedicando-se a melhorar a vida de outros portadores do HIV. Luciano Barreto, realizando o ideal do filho morto. E tantos outros... ou extravasando a dor até a última gota, lançando-a no papel, em prosa ou em verso. E como Ariadne, de repente a dor desaparece... some...
Wagner expôs em versos tão belos, translúcidos e musicais, a dor de Ariadne que eu senti o coração apertado. Parabéns, Wagner, por mais um precioso livro, trazendo de volta para nós o encanto da Mitologia Grega, da qual também sou fiel admiradora e cantora
xx