Shirley Rocha
Hoje será enterrado o corpo de um grande brasileiro que sentia orgulho de ser brasileiro – Ayrton Senna da Silva. Ficamos nós, os outros brasileiros, procurando palavras que dêem sentido, que exprimam nossos sentimentos de angústia, tristeza e muita saudade. Não há o que dizer para homenagear, quem já foi homenageado por todo o mundo!
Morreu o único motivo de verdadeiro orgulho e alegria de nós brasileiros, nestes dez últimos anos. Desapareceu o guerreiro bravo e querido Ayrton Senna. Seu sorriso sereno e contido de criança cativou, e continuará na lembrança de milhares de fãs, crianças, adultos e velhos. ‘Ele enchia de prazer nossos domingos; não havia nenhuma outra disputa que merecesse maior atenção; era um brasileiro vaidoso de ser brasileiro, que fazia o que muitos gostariam de fazer; ele engrandecia o nome do Brasil..’.Tinha coragem, disciplina, inteligência, persistência, liderança e senso de profissionalismo incontestável. Deu exemplos. Deixou marcas. Mostrou o valor e a capacidade de quem tem um ideal. Sua coragem, sua vida, não permitia abusos de colegas, cartolas ou da imprensa. Discutia regras de segurança, defendendo a vida de todos os pilotos; mostrava e reclamava quanto os cartolas e donos de escuderias estavam jogando com os pilotos querendo torná-los também máquinas, quando deixavam os carros cada vez mais velozes. Ele não queria a máquina ganhando – e sim – o homem, o piloto, o seu comandante. Conhecia como ninguém cada lance de corrida, detectava qualquer avaria, explicava positivamente cada falha e soberbo- sabia dizer –“A culpa foi minha. Ali eu errei porque...”
Tudo isso são atitudes de um líder, de respeito, de um excelente profissional. Defendia o podium, o primeiro lugar, mas cedia parte da glória se aquela alegria podia ser compartilhada, dividida. Assim ele fez certa vez, quem não se lembra, Senna já consagrado campeão, por pontos, deixa um companheiro chegar a sua frente, ele na reta de chegada, só para permitir que o outro também tivesse sua vitória. Estimado e respeitado pelos colegas, agia corretamente até quando bronqueava com as atitudes do enciumado colega Alan Prost. Suas ponderações eram corroboradas por todo mundo. E uma única vez que recebeu punição dos cartolas foi depois por esses absolvido com as devidas desculpas.
Senna – a vida já ensina que tudo que é bom passa a ter mais valor quando desaparece. Sua morte fará desaparecer a expectativa, a ansiedade ao ouvir sua música característica e a vibração do nosso locutor favorito nos futuros domingos, dias de corrida. Mas você ficará presente na lembrança, no carinho de todos os brasileiros e internacionalmente em muitos outros fãs que você soube conquistar. Sua despedida foi na hora que você executava seu motivo de vida, você corria, desenvolvia a velocidade, sua companheira mais procurada, pelos outros, mais temida. Fica a saudade e muita tristeza, mas você deixa também o exemplo de bom filho, irmão, colega e um profissional fora de série. E acima de tudo você deixou para todos nós, um exemplo de patriotismo, de amor e lealdade por esse pedaço de chão, que fica mais pobre perdendo um filho de fé, coragem, honestidade em tudo que fez na vida. Inclusive, quando cumpriu o dever naquela fatídica corrida, que você certamente, predestinado, já tinha condenado as curvas e talvez por isso uma infeliz terminou levando-o: Adeus Senna – que todas as suas boas ações tenham o reconhecimento do Pai e que onde você estiver seu sorriso possa ser o mais feliz possível.
JC- 05/05/1994. Lido e comentado na reunião da Academia dia 12.06.94.