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sábado, 8 de março de 2025

A MULHER NA HISTÓRIA

 

NOSSA HOMENAGEM AO DIA DA MULHER/ 8 DE MARÇO DE 2025

Maria Lígia Madureira Pina (1925-2014)

    Já houve quem afirmasse que quando alguém nasce, cresce, planta uma árvore e escreve um livro, sente-se plenificado e realizado. Isto não bastou para Lígia Pina que, além de publicar um belíssimo livro de poemas – Flagrando a Vida – laureado pela crítica, mergulhou de forma obstinada na pesquisa e nos anais da História, haurindo os subsídios que traçaram a trajetória daquela que tem sido a razão maior da luta contra os preconceitos e as discriminações: a mulher. Sim. Ela que escreveu com coragem, renúncia, competência e lucidez, grandes capítulos de mutações desde que caminha a humanidade. E assim surgiu esta grande obra. A Mulher na História.

    A Mulher na História é um livro escrito por quem possui uma forte inquietação sobre tudo que diz respeito ao poder da mulher. A autora penetra a alma da mulher, do seu silêncio, abandono, da sua grandeza e libertação. Com seu espírito de observação, encontra sempre um significado diferente para todas as coisas que a mulher pôde e pode realizar no contexto da vida. E, através de uma mensagem comunicativa, ela nos induz a pensar e refletir. Assim, esta obra não é apenas o repositório de informações preciosas sobre a via crucis da mulher desde os tempos primevos da História, partindo da filosofia opressora que enfrentou em épocas pretéritas; é um desafio no presente e o será no porvir. Observa-se que, em quase todas as situações, apesar dos percalços, a mulher sempre vislumbrou o sabor da vitória. A vitória foi sempre a tônica das mulheres fortes e da plêiade de mulheres que desfilam neste livro, transmitindo sempre lições de grandeza e heroísmo.

Numa prosa poética que apaixona o leitor, Lígia Pina elenca não somente a vida, mas o importante papel da mulher em todas as épocas, traçando o perfil de heroínas que marcaram presença no momento histórico em que viveram.

    O aspecto mais singular desta obra admirável é a oportunidade régia que a autora oferece a esta importante elite de mulheres as quais fizeram e fazem História. Cede, num gesto grandiloquente, a palavra, para que elas falem a Sergipe, ao Brasil e ao mundo, o que já sentiram e disseram através de seus poemas e criações nos diversos ramos do saber. A autora ainda, num rasgo de luz, permite que os gritos que ficaram parados no ar, sufocados nos alfarrábios do tempo, cheguem até nós, trazendo uma mensagem que transcende o momento histórico e justifica a nobreza de ser mulher.

    Provocando a sanha de preconceitos da velha Grécia, celeiro da intelectualidade do mundo antigo, destaca a coragem de Aspázia e Safo, as quais quebraram os grilhões do silêncio imposto à mulher, legando à História a luta em prol do direito de dizer, sentir e criar. Foram mulheres fortes que venceram as amarras do sistema preconceituoso dominante.

    A Idade Média com seus avanços culturais através das primeiras universidades propiciou à mulher um clima mais acessível à sua caminhada em busca de sua identidade sócio-cultural. E eis que surge a donzela de Orleans, Joana d’Arc, a impávida camponesa da doce Terra da França quando não era sequer uma nação unificada.

    Decorreram cinco séculos desde que Joana morreu na fogueira, em Rouen. Ainda continua relembrada com admiração, porque Joana d’Arc representa hoje, como no seu tempo, a luta constante entre o bem e o mal, a coragem e a covardia. “Vencedora das forças do mal que a destruíram, ela é venerada como santa imortal, símbolo da verdade e da coragem por todos que conhecem sua história e sua vida”.

    Com o advento dos tempos modernos este livro apresenta um cenário propedêutico ao surgimento de um grupo de mulheres que de direito e de fato transformaram a face do mundo, contribuindo em todos os ramos da ciência e do saber. Dentre tantas enumeradas pela autora, causa profunda emoção o papel de Hellen Keller. Em sua estrada palmilhada de supremo esforço, há uma auréola de admiração que a assombrosa história de sua vida bem justifica. Cega, surda e muda desde os primeiros anos de infância, conseguiu superar esta terrível inferioridade e tornar-se uma das mais famosas personalidades do mundo contemporâneo. Sua vida constitui um estímulo extraordinário não só para os cegos, mas também para toda a humanidade. O seu domínio da palavra é considerado “a maior vitória individual da história da educação”.

    Ao apresentar a mulher no Brasil, demonstra que o heroísmo de Joana Angélica e a samaritana generosidade de Irmã Dulce catalisam o poder e a glória que emanam do coração da mulher.

    Perlongando caminhos com a segurança de quem sabe onde encontrar cada mulher exercendo uma função de relevo, alça um altíssimo voo através das Américas, proporcionando um encontro com uma mulher de extraordinária força literária: Harriet Becker Stowe. Vivendo numa época de ebulição decorrente dos movimentos libertários e do descrédito do absolutismo, sua obra de fundo abolicionista, A Cabana do Pai Tomás, emociona a América e o mundo. O Presidente Abraão Lincoln não tergiversou em afirmar que sua obra valeu mais que um regimento para a abolição da escravatura nos Estados Unidos.

    Enfim, pesquisa, estuda e exalta as mulheres sergipanas: Maria da Conceição Melo Costa, grande educadora e escritora, Cezartina Regis, a primeira farmacêutica do Estado, D. Bebé, figura carismática e humana que fez de sua vida um poema de abnegação às crianças de nossa terra marcadas pela orfandade.

     “A mulher representa a grande energia, pois ela é o lar, quer dizer, o caráter, a escola, o espírito de toda a humanidade.” A. Austragésilo

     Se a mulher é toda essa fonte de energia, descobrimos em Lígia Pina, a cada momento que transmite com excepcional beleza e senso crítico, biografias de mulheres notáveis em todas as épocas, momentos e espaços com a poesia e o encanto de quem crê sem vacilar de que a presença da mulher na História foi sempre um lampejo de luta, solidariedade, inteligência, pertinácia e vitória.

    Seu estilo primoroso de narradora exímia, associado à verdade histórica, passando a limpo o papel da mulher às vésperas do segundo milênio, faz desta obra sui generis em termos de pesquisa, uma forma de resgatar a memória cultural do nosso Estado. A ilustre pesquisadora traz ao conhecimento de todos a história de mulheres sergipanas que saem do injusto ostracismo, a fim de que galguem o lugar de destaque que merecem no panorama intelectual de Sergipe.

    Thomas Carlyle afirmou com muita sabedoria:  “Nenhum grande homem vive em vão. A história da humanidade não é mais que a biografia dos grandes homens.”

     Tomo a deliberação de parafraseá-lo dizendo:

    Nenhuma grande mulher vive em vão. A história da humanidade não é mais que a biografia das grandes mulheres.

 Por Yvone Mendonça de Souza - professora, escritora e membro da Academia Literária de Vida, para o Prefácio do livro A MULHER NA HISTÓRIA..