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terça-feira, 8 de julho de 2014

8 de julho - Emancipação Política de Sergipe

Maria Lígia Madureira Pina

A 8 de julho, Sergipe comemora a sua independência política que aconteceu por Carta Régia assinada por Sua Majestade, Senhor do Reino Unido de Portugal Algarves e Brasil, em 1820. Mas não foi apenas o Decreto Real que nos tornou independentes da Bahia, como não foi somente o Grito do Ipiranga que tornou o Brasil independente de Portugal: em ambos os casos tivemos de lutar pela liberdade.
Observamos num rápido panorama retroativo os antecedentes históricos até o ano 1820: desde a divisão do Brasil em Capitanias hereditárias, em 1532 Sergipe passou a fazer parte da Capitania da Bahia, doada a Francisco Pereira Coutinho. Com a morte do donatário, o seu filho e herdeiro Manuel Pereira Coutinho ficou sem recursos para continuar a colonização. Por essa época, D. João III resolveu criar o Governo Geral, com a intenção de ajudar os donatários a resolver os problemas da Colônia. Precisava criar a sede do Governo. A Capitania da Bahia foi comprada ao herdeiro pela Coroa e foi construída a primeira capital do Brasil-Salvador. Consequentemente, Sergipe passou a fazer parte dos domínios da Coroa Portuguesa, mas fazendo parte da Bahia e relegada ao abandono.
Em 1590, o governo da Bahia apoiado pelo Rei de Portugal resolveu conquistar as terras de Sergipe aos índios e seus aliados, os franceses. Cristóvão de Barros com as suas tropas dizimaram os índios e expulsaram os franceses. O conquistador para garantir a posse da terra fundou um núcleo de povoamento a que deu o nome de São Cristóvão. O Rei presenteou Cristovão de Barros com as terras por ele conquistadas dando-lhe o direito de doar Sesmarias. Surge assim a Capitania de Sergipe Del Rei, tendo como primeiro Capitão-Mor Tomé da Rocha. E após Tomé da Rocha, vários outros governantes, até 1696, quando um Decreto Real anexou Sergipe novamente à Bahia como Comarca. E assim iria permanecer até 1820, quando da Carta de Dom João VI.
- Por que Dom João VI emancipou Sergipe da Bahia? Vejamos: Em 1817 irrompeu em Pernambuco uma revolução contra o Poder Real, pretendendo proclamar uma República. Os insurretos levaram suas hostes até Alagoas e se apossaram de Penedo. Mas Sergipe não aderiu à Revolução tendo surgido em Vila Nova (Neópolis) um movimento a favor do Rei. Sufocada a Revolução a ferro e fogo, condenados a morte, El Rei houve por bem recompensar Sergipe com a independência através da Carta Régia, que transcrevemos conforme ortografia da época, “Conde de Palma do Meu Conselho, Governador e Capitão General da Bahia, Amigo. Eu, El Rei vos envio muito saudar como aquelle que amo. Convindo muito ao bom regime deste Reino do Brazil e prosperidade a que me propondo elevalo, que a Capitania de Sergipe Del Rei hum Governo independente do dessa Capitania. Hei por bem por Decreto da data izentá-la absolutamente da sujeição em que até agora tem estado desse Governo, declarando-a independente totalmente para que os Governadores della a governem na forma praticada nas mais Capitanias Independentes comunicando-se diretamente com as Secretarias de Estado competentes e podendo conceder sesmarias na forma das minhas Reais Ordens. O que Me pareceu participar-vos para que assim tenhais entendido. Escrevo do Palácio do Rio de Janeiro em 8 de julho de 1820. Rei”.
A notícia da Carta só chegou a Sergipe em 24 de outubro, ou porque os meios de comunicação fossem lentos ou porque não interessava ao Conde Da Palma e aos senhores proprietários de terras e engenhos de Sergipe, a emancipação.
No dia 25 de julho o Rei já havia nomeado o Brigadeiro Carlos Cesar Burlamarqui Presidente da Província de Sergipe Del Rei. Ele aqui chegou em fevereiro de 1821 tendo passado antes pela Bahia sem que nenhuma objeção lhe tivesse sido demonstrada. Em aqui chegando encontrou sérias divergências partidárias: os que queriam a independência e os que não a aceitavam. E mais, os reflexos da Revolução Constitucionalista do Porto em todo o Brasil. No Rio de Janeiro, Dom João VI cedera á pressão dos políticos e do povo, concordando com a Constituição que seria promulgada quando fosse elaborada. Aqui em Sergipe o impasse: jurava-se ou não a tal Constituição? Carlos Cesar Burlamarqui que tomara posse do Governo a 26 de fevereiro era contra o juramento sem que se ouvisse a palavra do Rei. Tentando solucionar o problema Bento Pereira de Mello segue para o Rio de Janeiro para saber o que o Rei determinara. Tempo perdido. Em lá chegando a Família Real já havia retornado a Lisboa. Aqui ficara, Dom Pedro como Príncipe Regente. Em Sergipe Burlamarqui foi deposto do governo, feito prisioneiro e remetido à Bahia, sendo entregue ao Governo Revolucionário que o enviou para a prisão infecta do Forte do Mar e depois do Forte Barbalho. O seu governo durara apenas um mês. Pedro Vieira de Mello, um dos senhores de terra refratários a independência, toma posse do governo e tudo voltaria ao que dantes era se novos acontecimentos não houvesse eclodido no Brasil.
A partir de janeiro de 1822 com a pressão das Cortes portuguesas sobre o Brasil agiganta-se o movimento Pró-independência. Daí em diante os problemas de Sergipe vão andar “pari passu” com os dos brasileiros em geral.
Formaram-se dois grandes partidos: o dos brasileiros e alguns portugueses que queriam a independência e o dos portugueses e alguns brasileiros que não aceitavam a independência. Entre esses últimos estavam: Pedro Vieira de Mello, José de Barros Pimentel, Domingos Coelho e Mello, José Ribeiro Navarro, José Alves Quaresma, José Caetano Faria, e o Padre José Antonio Gonçalves de Figueiredo.
A 7 de setembro, Dom Pedro lança o brado de Independência ou Morte, mas muito foi preciso realizar para que o brado se concretizasse. Os portugueses não aceitaram o fato como consumado e em algumas províncias houve luta aberta entre as duas facções, especialmente, na Bahia, onde as tropas de Madeira de Mello resistiram ao Imperador. Sergipe teve um papel muito importante na defesa da retaguarda durante a guerra. Labatut (o francês contratado para dirigir as tropas brasileiras), quando passou por Sergipe instalou uma Junta Governativa Independente, constando dos seguintes elementos: José Mateus da Graça Leite (Presidente) Guilherme José Nabuco de Araujo (Governador das Armas), João Serafim Alves Rocha (Secretário) João Francisco de Menezes Sobral, Dionísio Rodrigues Dantas, Domingos Dias Coelho e Melo. No dia 14 de novembro de 1823, Labatut nomeia governador José Eloi Pessoa da Silva em nome do Imperador. Os senhores de terra ficaram descontentes. José de Barros Pimentel se aproxima de Labatut e com intrigas o convence a depor José Eloi que é aprisionado e remetido para Pernambuco. No dia 5 de dezembro de 1822, Dom Pedro confirmou por Decreto, a Carta Régia de Dom João VI que tornava Sergipe independente da Bahia. Inconformado, José de Barros Pimentel se apossou do governo opondo-se ao Decreto.
O povo reage e exige a reinstalação da Junta Governativa de 1º. de outubro de 1822. Barros Pimentel tenta reagir, mas não tendo apoio refugiou-se na Bahia.
A 3 de março de 1824 a Câmara de São Cristovão aclamou Dom Pedro Imperador Constitucional do Brasil. Estava encerrado o traumático processo da independência, tanto do Brasil como se Sergipe. A 7 de março, Dom Pedro nomeia Manuel Fernandes da Silveira, Presidente da Província, e ele assume o governo em 25 de outubro de 1824. Encontrou muitas dificuldades, a ponto dele mesmo dizer que “vim governar homens que não estão acostumados a serem governados”.
Terminada a narrativa histórica não me poderia furtar a uma rápida análise dos fatos ocorridos há 194 anos e de compará-los com os dias em que vivemos. Nestes 194 anos de independência política atravessamos várias revoluções, brancas e ensanguentadas. Mudanças de Sistema de Governo e Regime de Estado. Somente a última Ditadura Militar durou vinte anos. Logo no inicio da República (1891) o presidente Deodoro da Fonseca determinou o fechamento do Congresso e depois renunciou ao Governo. O Vice-Presidente Floriano Peixoto assumindo o poder, enfrenta revoluções e governa os três anos, sob regime de força. Arthur Bernardes governa sob estado de sítio. Getúlio Vargas é ditador por oito anos. São ao todo cinquenta anos de regime de exceção. Não aprendemos ainda a viver a Democracia, pois o que vemos durante todo esse tempo?
Sergipanos e brasileiros que continuam agindo como aqueles senhores de engenho de 1820 que sobrepõe seus interesses ao bem comum: gananciosos, exploradores do povo e destruidores do bem público. O Brasil cresceu sim, mas sem regras, sem equitatividade. A impunidade reina insubmissa e o desperdício é total. Já é hora de refletirmos, de termos coragem de vencer esses obstáculos. Está na hora de o Brasil crescer não apenas como Estado, em suas relações internacionais. O Brasil é a Nação, isto é, o conjunto - território e povo - brasileiros. E esse povo precisa de trabalho, saúde, educação para sairmos com dignidade de país emergente e nos elevarmos ao nível das nações evoluídas. De que adianta sermos uma das maiores economias mundiais se grande parte dos brasileiros não têm condições dignas de sobrevivência? Se crianças continuam sem escolas, jogadas na rua, no lixo?
O Brasil possui mais potencial físico e econômico que muitas das nações do primeiro mundo: mais cachoeiras e rios, (potencial hidráulico), mais potássio, mais salgema, mais petróleo, mais ferro, mais minerais nobres, mais terras, que muitos deles juntos. Urge mudar. Não de forma de governo ou regime de estado, o que já vimos, não adianta. É necessário mudar as consciências e atitudes. É termos coragem de enfrentar as dificuldades, é ter vontade política para criar um Brasil novo. E em quem depositarmos as nossas esperanças? Deveríamos pensar nos jovens de hoje, futuros dirigentes do País, mas como fazermos se os jovens não estão sendo preparados para viverem novas experiências, que levem o Brasil a sistema mais justo, que favoreça ao seu povo?.
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Para a reunião comemorativa na Academia Sergipana de Letras, 07.07.2014..